O torcedor / Artigo de Ney Arruda Filho

Eu gostava de fórmula 1, acho que mais do que de futebol. Assistia às corridas, vi Emerson Fittipaldi ser campeão com sua Lotus preta, vi Piquet, vi Senna. Meu filho mais velho, Rafael, foi quem mais me acompanhou nas madrugadas e manhãs de domingo. Até fomos assistir a um GP do Brasil, no início dos anos 90, época de grandes duelos entre Piquet e Mansell, Senna e Prost. Depois desses vieram outros pilotos brasileiros, com destaque para Rubinho e Felipe Massa, este último o “quase campeão” em 2008. E foi logo depois disso que me dei conta de uma coisa: na verdade eu não gostava de fórmula 1, pensava que gostava. Eu gostava, mesmo, era de ver algum brasileiro vencer.

Diferente de mim, Rafael gostava e segue gostando, a ponto de passar este gosto para Nicolas, seu filho e meu neto de 4 anos. Mesmo sem brasileiros no circuito, eles assistem aos treinos, vibram com o grid de largada e curtem cada ultrapassagem, cada volta, até a bandeirada final. Com seus carrinhos miniatura, Nicolas brinca sobre um tapete, que simula um circuito de corridas. Ele faz as tomadas de tempo, monta o grid de largada, invariavelmente com seus preferidos na frente. Foram-se Piquet, Senna, Rubinho e Massa, agora é a vez do Verstappen, Sérgio Perez, Leclerc, Norris e outros. Como não acompanho muito, tento me inteirar e participar das brincadeiras. Ele me “nomeia” o cronometrista, responsável por anotar os tempos e auxiliar na montagem do grid. Para quem curte brincadeira de criança, como é o meu caso, a função é especialmente divertida. Ele pega o carrinho e me informa, “vô, agora é o Latifi”, que da primeira vez cheguei a corrigir, dizendo que era o Laffitte, sim, o Jacques Laffitte, mas este corria nos anos 1980. Nicolas sorriu e disse com firmeza: “não vô, é Nicholas, que nem eu, só que Latifi”. Ordem recomposta na pista, passamos à tomada de tempo, mas estranhamente o tal Latifi andava devagar, demorando mais de 5 segundos para completar a volta. Estranhei, mas anotei o tempo. “Agora é o Hamilton”, pensei que seria rápido, afinal, este eu conheço, corre de Mercedes e já foi campeão sei lá quantas vezes. Mas não, ele foi lento também, ficou atrás do Latifi. “Agora é o Verstappen!”. Cronômetro na mão, mal consegui acionar e o tal Max já concluía a volta, em pouco mais de 2 segundos, cravando a pole position. Ficou clara a preferência, mais do que isso, a total falta de chance para qualquer outro piloto. Na brincadeira do Nicolas, Verstappen sempre larga na pole e sempre ganha a corrida.

Eu e Rafael nos olhamos e sorrimos. Deixa assim, é brincadeira de criança. O tempo e a vida vão ensinar pra ele as regras do jogo. E que elas devem ser respeitadas, para que o jogo siga existindo.

Arruda Advogados OAB-RS 072

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